
Capítulo 1 parte final
Escolhendo as palavras com cuidado, Lua tentou responder. Nunca
enveredara por aquele tipo de conversa pessoal antes e se perguntava por que o
chefe trazia o assunto à baila agora. Era óbvio que Eugene tentava bancar o
cupido.
— Não sou moderna o suficiente para a maioria dos homens — foi a resposta
clara e honesta.
Arthur examinou-a com atenção.
— Você diz moderna em relação à liberação sexual? Sentindo as faces corarem,
Lua respondeu:
— Meus pais eram de meia-idade quando nasci e são pessoas muito
convencionais. Me ensinaram que o amor
deve significar algo mais do que apenas sexo. Mas eu descobri que, para a
maioria cios homens, amor quer dizer um bom jantar seguido de uma sessão na
cama. Ninguém quer levar tempo construindo uma relação, especialmente quando
existem tantas mulheres que não querem um relacionamento mais sério. Portanto,
desisti de sair para programas com finais desagradáveis e trouxe Norman para
morar comigo.
Arthur franziu o cenho.
— Norman?
— Norman, meu iguana — explicou a secretária, orgulhosa. O chefe
empalideceu, olhando-a horrorizado.
— Seu o quê?
— Meu iguana. É um bom animal de estimação — explicou Lua, na defensiva. —
Eu o comprei quando era apenas um bebê.
— Um iguana! — Arthur olhou em volta do escritório como se esperasse que a
secretária tivesse trazido.o animal para o escritório dentro da bolsa. — Meu
Deus, ninguém tem um iguana como animal de estimação! É uma cobra com pernas,
pelo amor de Deus!
— Não é! Na verdade, ele parece um pequeno dragão chinês. É descendente
dos dinossauros da antiguidade. É quieto, limpo e o senhor devia ver o efeito
que ele tem nos vendedores! Norman mede noventa centímetros, apesar de ainda
ser criança — murmurou Lua, sorrindo.
Nunca discutia coisas pessoais com o chefe e provavelmente ele nem
soubesse que era prima de Jenny, que a avisara do emprego havia dois anos.
— Por que tem um réptil como animal de estimação? Está tentando criar seu
próprio príncipe?
Lua suspirou, aborrecida.
— Isso só funciona com sapos. Tenho Norman como animal de estimação, não
o beijo. — Franziu o cenho. — Apesar de tê-lo beijado quando ele era pequenino…
— Meu Deus! — Arthur olhou-a admirado. — Por isso é que não sai com
rapazes! Nenhum homem sai com uma mulher que anda por aí beijando iguanas!
— Não há perigo disso — suspirou Lua, lembrando-se do dia de Natal, em que
seu chefe quase a beijara, mudando de idéia momentos depois.
Levantando-se e andando em volta da própria mesa, Arthur acabou por
sentar-se de novo em sua cadeira.
— Agora eu entendo. Uma noite haverá um homem no seu apartamento e você
chamará a televisão e a imprensa para explicar como ele apareceu. Primeiro,
escolheu seu iguana e o beijou, e de repente, puf! Aparece o príncipe
encantado! — Franziu o cenho. — Ou será que conseguirá um rei com algo tão
grande quanto um iguana.
— O senhor será o primeiro a saber quando isso acontecer — prometeu Lua.
O chefe acendeu um cigarro, divertido com a reação impassível da
funcionária.
— Você me comprou este cinzeiro de Natal. — Acho que sim.
— Tentei parar de fumar.
— Não chamo sair à noite para comprar cigarros tentar parar de fumar —
comentou Lua, empurrando a correspondência para perto do chefe, indicando que
havia muito trabalho a fazer.
Arthur sorriu, indulgente.
— Sei que estou enrolando. Já lhe disse o quanto odeio responder a
cartas? Ainda estou tentando me recobrar de ontem à noite. Karol quis ir a um
concerto. Ficamos sentados durante quatro horas ouvindo música de câmara.
Odeio quartetos de cordas. Preferia ter ido a um show de música country, mas
ela não considera violinos cultura.
Lua deu uma risadinha.
— Do que está rindo? Claro que você sabe que os violinos são parte do
folclore americano, e isso é cultura!
— Para o senhor, chili é cultura! — Lua lembrou-o.
— Claro que é. É a única comida americana da qual gosto. Por que, em nome
de Deus, abotoa as blusas até o queixo? Tem medo que eu enlouqueça só em ver um
pouco do seu pescoço nu? E nunca mais soltou o cabelo desde o Natal.
Os olhos da secretária se arregalaram. Era a coisa mais pessoal que o
chefe já lhe dissera e ela estava chocada.
— É blusa de gola alta — gaguejou.
.— Não gostei dela. Não dá para você comprar alguma coisa que tenha
decote em "V"? E também podia comprar um vestido acinturado.
— Por que esta fixação pelo que eu visto? — explodiu ela, já sem
paciência. — Meu cabelo está errado, não gosta das minhas roupas, não sei
abotoá-las!
— Não sei — respondeu Arthur, deixando o olhar passear pelo que dava para
ver das pernas bem torneadas de sua secretária, com visível interesse. —
Talvez meu pai tenha razão e eu não deva ter uma secretária que se veste como
velha.
Lua olhou-o, estupefata.
— Sr. Aguiar, o senhor está bem?
Arthur suspirou.
— Estou frustrado — respondeu ele, apagando o cigarro.
— Tente passar quatro meses sem mulher e veja o que acontece. Lua sentiu o
rosto pegar fogo, mas não se deu por achada.
— Passei vinte e três anos sem mulher e estou muito bem, obrigada.
— Você entendeu o que eu quis dizer —; disse Arthur, bravo. Infelizmente,
Lua entendia bem. Ele era o homem mais
franco que já conhecera. Dizia tudo o que pensava, não importava o quão
chocante pudesse ser. Franzindo os olhos, Arthur prescrutou o rosto da
secretária.
— Você nunca fala da sua vida amorosa.
— Acho que posso inventar algo, se o senhor ficar contente.
— Foi o que pensei.
Seu chefe a olhava de modo estranho. Parecia observá-la mais nesses
últimos dias, fazendo-a sentir-se como um inseto ou um animal raro.
— Passar muitas noites sozinha pode tornar uma mulher vulnerável, sabe? —
dizia o chefe. — Especialmente uma mulher do tipo reprimido.
— Está tentando me dizer alguma coisa? — finalmente Lua indagou, curiosa.
— Estou preocupado com você — declarou Arthur, surpreendendo-a. — Ben
Meadows, o novo gerente de vendas, me disse que está tentando sair com você há
semanas, mas que você o manteve a distância. — E, sorrindo de modo provocante,
olhou-a com atenção. — Ben acha que você não sai com ele por ter uma queda por
mim. Na verdade, meu pai também acha isso.
Lua não pôde evitar de ficar vermelha. Seu coração ameaçava saltar pela
boca!
— Meu Deus!
— Não precisa fazer parecer como se isso fosse uma perversão — disse o
chefe, calmo. — As mulheres costumam me achar atraente.
— Um tipo de mulheres, com certeza. Não eu!
Arthur ficou parado, fazendo-a
imaginar se tinha ido longe demais dessa vez. Ele parecia imóvel, mas os olhos
estavam franzidos e frios.
— Por que não você?
— É pessoal.
— E daí que é pessoal? Quero uma resposta.
Lua suspirou fundo. Não podia mentir para ele, mesmo que fosse melhor
mentir.
— Porque o senhor é um mulherengo, sr. Aguiar. — E, baixando o olhar,
continuou: — Sinto muito, mas não considero esse tipo de homem muito atraente.
O chefe deu uma longa baforada no cigarro, deixando escapar uma nuvem de
fumaça, os olhos mais frios que nunca.
— Acho que pedi por isto. Não percebi que tipo de resposta eu poderia
ter. — E, sentando-se ereto na cadeira, inclinou-se para a frente. — Muito bem,
Lua, você me convenceu que meu pai não sabe o que está falando. Vamos responder
à correspondência.
Sentindo-se culpada por mentir, Lua não tinha como retirar o que dissera.
Mas aprendera na primeira semana de trabalho com Arthur o quanto ele
respeitava uma pessoa de opinião forte, Sentia que havia ferido o amor-próprio
do chefe. Arthur a tratava com indiferença, o que a magoava.
Perguntava-se por que ele era tão promíscuo. Em dois anos percebera qual o
tipo de mulher que Arthur apreciava. Mas não conhecia seus sentimentos ou
idéias. Sabia que sua mãe morrera havia dez anos e que o pai se casara
novamente com uma mulher de nome Cynthia. Lua sabia que Arthur passava algum
tempo com eles, embora nunca tivesse feito comentário a respeito.
Arthur começou a ditar, andando de
um lado para outro como de costume, e Lua teve de esforçar-se para acompanhar
seu ritmo.
No resto do dia seu chefe se manteve mais calado do que o normal. Atendera
às ligações que ela passara, tivera as reuniões de costume,,mas não pedira
café e nem lhe dirigira mais a palavra.
No fim do expediente, saiu, apenas meneando a cabeça.
Lua viu-o ir embora, confusa. Talvez não devesse ter dito nada. Tinha
complicado as coisas.
Cobrindo a máquina de escrever e o microcomputador, pegou sua bolsa, o
casaco e dirigiu-se à fila do ônibus. Viu que sua condução chegava, mas seus
pensamentos estavam longe, com seu chefe. Um dia desses beijarei meu iguana,
dizia a si mesma, e ele se transformará num homem tão bonito quanto Robert
Redford e aí o senhor vai se arrepender, sr. Aguiar! Ele vai me comprar casacos
de mink e brilhantes e moraremos num lugar luxuoso.
Só percebeu que estava falando alto quando viu a expressão da mulher a
seu lado.
— Sou escritora — improvisou. — É um ótimo enredo, o príncipe iguana e…
— É? A parte sobre Robert Redford foi ótima — disse a mulher mais velha,
que a observava. — Mas ninguém beijaria um iguana!
Lua apenas sorriu.
E aí tão gostando? Posso postar o próximo capítulo???
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