CAPÍTULO 3 parte I
Lua suspirava ante a atitude distante que o
chefe tomou durante os dias que se seguiram. Não conversava mais do que o
estritamente necessário, somente dirigindo-lhe. a palavra quando era assunto de
trabalho. Nem a tratava mais como se ela fosse sua irmã mais nova. Lua
sentia-se como uma peça do mobiliário do escritório e Arthur dificilmente lhe
dirigia o olhar. Voltara a vestir-se do modo habitual, mas provavelmente o
chefe nem notaria se ela fosse trabalhar nua, tal era sua indiferença. Arthur
dissera que não iria complicar o relacionamento deles, e, com efeito, estava
mantendo a palavra!
Nunca Lua se sentira tão sozinha, nem quando
se mudara para morar com a prima Jenny havia dois anos. Queria ser
independente, viver a própria vida e seus pais tinham aceitado aquela
necessidade. Mas agora sentia falta da família e sentia falta de Jenny, que era
uma boa ouvinte. A prima, porém, ainda estava viajando a trabalho. Gostaria de
ter perguntado a Eugene se tinha notícias de Jenny, mas a ocasião não parecera
das mais propícias.
Lua precisava ter alguém para conversar,
pois só agora percebera o quanto Arthur crescera em importância em sua vida.
Quer dizer, o quanto ela própria deixara que isso acontecesse. Ia com
entusiasmo para o trabalho porque o sorriso do chefe a fazia vibrar, sua
masculinidade a excitava, seu humor a fazia rir. Só estar perto dele já o fazia
sentir-se mais viva do que nunca.
Tinha sonhos eróticos com Arthur desde a
manhã em que ele a acariciara nos lábios. Mas aquela manhã podia nem ter acontecido,
pois Arthur estava determinado a ser apenas profissional durante o trabalho. E
Karol andava muito em evidência nesses últimos dias. Arthur falava nela a toda
hora, como se quisesse impedir que Lua alimentasse idéias românticas a seu respeito.
Terminando de digitar as cartas, Lua as pôs
de lado; os dedos finos ainda descansavam sobre o teclado do micro. Talvez Arthur
quisesse mandá-la embora. O pensamento a fez sentir-se profundamente infeliz.
Estava acostumada com o humor do chefe e com seu temperamento e não gostava da
idéia de trabalhar para outra pessoa. Mas, se era isso o que ele queria…
Arthur apareceu quando Lua fazia planos para
o futuro, fazendo-a pular de susto ao ouvi-lo.
— Nervosa? — ele perguntou. — Algo errado?
Lua entregou-lhe as cartas impressas no fino papel timbrado da empresa.
— Pelo amor de Deus! — explodiu Arthur. —
Agora chega! O que está errado?
— Quer que eu me demita? — Lua perguntou,
decidida.
— Você quer se demitir?
Ela baixou os olhos para a camisa branca e
bem passada do chefe.
— É um bom emprego — começou ela. — Mas se
prefere me mandar embora, eu irei.
— Não sei o que prefiro — foi a resposta
lacônica. Tentara não prestar atenção na secretária, tentara ser frio, mas
aquilo se voltara contra ele. Ele a magoara de novo e sentia-se terrível com a
vulnerabilidade dela. Por que não conseguia esquecer a expressão de Lua quando
quase a beijara? Por que não conseguia achar consolo na companhia de Karol?
Com um longo suspiro, Arthur pegou uma das
mãos de Lua, levando-a até seu próprio peito. Embaixo do fino tecido da camisa,
ela podia sentir os músculos rijos e o calor daquele corpo. Arthur estava em silêncio enquanto Lua pressionava os
dedos contra o peito forte, fazendo com que ele precisasse se esforçar muito
para não fazer com ela tudo o que tinha vontade.
Lua sentia-se derreter por dentro. Sentia o
calor que emanava de Arthur, podia perceber os pêlos finos cobrindo o peito
másculo. Nunca o vira despido, mas, nesse momento, desejava ter visto.
Imaginava como Arthur seria por baixo das roupas, e como seria senti-lo
envolvendo-a com seus braços e beijando-a ardentemente, como fazia com todas as
outras. Queria ouvi-lo sussurrar, como tinha feito aquele dia no campo de
petróleo de Harry Deal.
De modo involuntário, Lua deixou escapar um
suspiro. Não conseguia mais respirar direito é agora sabia que sua mente também
não funcionava mais como de costume. Só uma mulher louca se permitiria ficar
tão curiosa assim com relação a um chefe mulherengo.
Os dedos experientes de Arthur acariciaram os
de Lua e ele pôde ouvi-la respirando com dificuldade, maravilhado por ver que a
secretária estava dócil e quieta. Ficara lisonjeado quando Ben Meadows e seu
pai haviam sugerido que a secretária tinha uma queda por ele, por isso quase a
beijara no carro. Só que não contara com o efeito devastador que Lua teria nele
e nem com os comentários que ela fizera acerca de seu modo de vida. Sempre
imaginara como Lua reagiria se recebesse uma cantada de seu chefe. Sentira-se
tentado a fazer isso nas últimas semanas, graças aos constantes comentários do
pai, chamando sua atenção para a funcionária. Lua era bonita e estava
começando a perturbá-lo fisicamente, Tentara ignorá-la, mas estava ficando
impossível não reparar nela.
— Seus dedos estão gelados — comentou Arthur,
a voz rouca, por sentir o perfume de lavanda que emanava de Lua, em contraste
com os perfumes franceses das moças com quem costumava sair. Mulheres que
corriam atrás dele e cuja agressividade o irritava. Não havia nada de
agressivo em Lua e ela era pura e inocente. Isso fazia com que Arthur começasse a nutrir algumas fantasias a seu
respeito, sobre como iniciá-la nos mistérios da intimidade. Não podia
esquecer-se da expressão nos olhos cinzentos quando ele sussurrava o quanto
queria beijá-la e ser seu professor…
— O escritório está frio — foi o comentário
de Lua.
— Vou aumentar a temperatura do
ar-condicionado.
— Faça isso — respondeu Arthur, surpreso com
a tonalidade normal da voz de sua secretária. Mas, apesar do que dissera, não
a largou. Uma das mãos foi desde o pescoço até o delicado queixo,levantando-lhe
o rosto. Seus dedos passearam preguiçosamente por seu rosto até pararem nos
lábios. Era exatamente o que havia feito no carro, provocando o mesmo choque
nos olhos cinzentos, enquanto um gemido escapava da boca feminina.
Arthur gostou daquele som. Gostou mais ainda
da sensualidade chocada que via refletida nos olhos dela, muito mais forte do
que no outro dia. A fascinação estampada na expressão de Lua falava por si
mesma. O toque de seus dedos tornou-se mais insistente e os lábios carnudos se
abriram para ele. Com a outra mão, Arthur segurou-lhe a nuca firmemente.
— É aqui que a brincadeira acaba — disse, a
voz rouca. — Quando minha boca cobrir a sua, não haverá volta.
— Não é justo — protestou fracamente Lua,
como que meio encantada com toda a cena. — É como pescar com um tubo de
dinamite…
— Sim — Arthur concordou, a voz suave,
começando a se aproximar mais e mais dela. — Vai ser assim que nos sentiremos,
querida, como dinamite sendo explodida. Gosto disso. Assim…
Lua sentiu que a mão de Arthur segurava sua
nuca de modo mais firme, fazendo seus joelhos tremerem. Podia respirar o hálito
quente que emanava da boca tão próxima da sua.
Mas, quando sentiu o leve toque dos lábios
de Arthur nos seus, ouviu a campainha insistente do telefone, desfazendo toda a
magia do momento. Lua tremia dos pés à cabeça, sem conseguir se mover. Quem
teve de atender ao telefone foi seu chefe.
— Aguiar.
— Arthur, pode sair mais cedo hoje para ir a
um jantar de caridade comigo? — perguntou a voz melodiosa de Karol. — É em
benefício do Hospital Infantil.
— Hoje? — repetiu Arthur, de modo ausente. —
Acho que sim. Eu apanho você às cinco horas.
— Que amor! Obrigada, querido. Até mais
tarde. Karol desligou, mas Arthur não pôs o fone no gancho. Ainda estava
olhando para a expressão chocada de sua secretária.
O silêncio entre eles era tão explosivo
agora quanto havia poucos segundos, mas nenhum dos dois conseguia proferir palavra,
e foi nesse instante que Ben Meadows entrou na sala, com um monte de papéis.
— Desculpe incomodá-la, mas preciso de
algumas cópias xerox — disse ele, entregando a pilha nas mãos de Lua.
— Pode… deixar comigo — ela respondeu,
pegando os papéis e saindo correndo para a sala onde ficava a máquina de xerox.
Durante o resto do dia, Arthur não se
aproximou de Lua de novo. Ela não sabia se ficava feliz ou não com aquilo, mas
o relacionamento deles havia mudado para sempre naqueles minutos cruciais.
Após o expediente, foi para seu apartamento
solitário, desejando que sua prima estivesse lá. Mas a prima mais velha, uma
loira estonteante, não voltaria tão cedo. Jenny passava a maior parte do tempo
em expedições para lugares rústicos e Lua sabia que às vezes eram lugares
perigosos. Certa vez um homem a seguira até o apartamento, tentando conseguir
informações preciosas sobre os metais que estavam sendo explorados.
Mesmo agora, as cartas de Jenny era cheias
de intrigas sobre seu emprego e Lua se preocupava com ela. Já invejara o
trabalho da prima, mas, quanto mais ficava com Arthur, menos sentia atração
pelo modo de vida de Jenny. Soem pensar em mudar de emprego já a entristecia. E
Lua se recusava a admitir por quê.
Ao abrir a porta, viu Jenny, como que em
resposta aos seus pensamentos. Jenny estava mais linda do que nunca, bronzeada
e exuberante.
— Lu! — exclamou ela, feliz, abraçando a
prima. — Como é bom estar em casa de novo!
— Você não devia estar aqui! — riu Lua, toda
feliz. — Puxa, mas fico contente por você estar! Você está linda!
E estava mesmo. O longo cabelo loiro caía em
ondas suaves, e sua roupa branca contrastava com o dourado de sua pele. E
olhou a prima, desejando ser parecida com ela.
— Quanto tempo você pode ficar?— indagou,
enquanto ia até a cozinha preparar o jantar.
— Só esta noite — foi a resposta, para
desencanto de Lua. — Desculpe, querida, mas estou a caminho de outro lugar. E
não posso contar mais nada além disso. Não se preocupe. Só se preocupe com o
lagarto aqui. Norman fica me olhando como se imaginasse qual é o meu sabor.
-- Ele não come carne. É vegetariano — explicou
pela ené-sima vez Lua, como vinha fazendo desde que trouxera o animal para casa
havia dois anos.
Norman era ótima companhia, não era
exigente, sempre ficava quieto em seu canto e era um excelente repelente para
ladrões. Uma vez, um ladrão tentara entrar no apartamento e fugira, em pânico,
após dar de cara com o réptil, quase atropelando Lua no caminho. Norman ficara
no corredor da sala, olhando tudo com sua expressão indiferente, a boca aberta
e a cauda abanando ameaçadoramente para o intruso. Quando Norman fosse mais
velho, sua cauda seria ainda mais ameaçadora e Lua sentia orgulho dele. Só não
ficara muito satisfeita quando um namorado seu fugira para sempre depois de ver
seu animal de estimação.
— Que acontece se ele me morder e gostar?
Lembra-se do Capitão Gancho e do crocodilo? — Jenny comentou.
— Norman nunca experimentou você. — Lua
sorriu. — E de qualquer modo, ele gosta de você!
— Gosta? — Jenny estava incrédula. — Como
você pode saber? — perguntou, observando o lagarto.
— Posso ler a mente de Norman. Sei que você
adora seu emprego, mas é mesmo necessário todo esse suspense?
Jenny riu, deliciada.
— É preciso, sim. Considero como um serviço
patriótico para o meu país. Talvez até para o mundo, quem sabe? Agora chega de
falarmos de mim. Conte-me sobre você.
— Não há nada a contar. Não sou linda como
você.
— Eu não sou linda. Só tento melhorar o
máximo de mim que posso. Na verdade — disse Jenny, estudando a prima mais nova —
você também pode ser linda. Pode ser muito atraente, se quiser. Por que tem
esta compulsão em se disfarçar parecendo um móvel ou uma parede?
— Não estou imitando coisas inanimadas. Só
estou me preservando, é só.
— Conhecendo seu apetitoso chefe, o sr.
Aguiar, posso entender. Ele derreteria um muro de tijolos. Mas ele não é o único
homem na face da terra, Lu. E você já tem quase vinte e quatro anos. Não se
enterre naquele escritório passando a vida nutrindo uma paixonite pelo chefe
bonitão.
Lua arregalou os olhos.
— Não estou nutrindo uma paixonite por
Arthur Aguiar!
— Não está? — indagou Jenny, apanhando pão e
maionese da geladeira, fazendo uma pausa para pegar talheres e pratos antes
de sentar-se. Seus olhos azuis eram bondosos e preocupados. — Você só fala
nele, quando eu estou em casa. Não sai com nenhum homem há quase um ano.
— Não-quero ter de lutar com os homens —
explicou Lua.
— Não é isto. Você está apaixonada pelo Sr Aguiar.
— Isto é ridículo! — Lua riu, nervosa. —
Pegue um pouco de presunto.
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